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viernes, 8 de mayo de 2015

Mina de Carvão - Chiflón del Diablo (em portugues)

(escrito por Camila Santos)

Como de costume as estradas nos levaram mais uma vez para um lugar interessante, onde pudemos ver e aprender como a geologia aqui se inter-relaciona com história, economia, política, Direitos Humanos e das Crianças.

Entrada da Mina



Bem ao centro do comprido país de Chile, está a cidade de Lota, na região VIII (Bio-Bio), ao lado de Concepción, segunda maior cidade chilena. Lota foi uma das cidades mais importantes para Chile, hoje em dia se vê apenas um povoado humilde com construções antigas e pessoas com muitas histórias para contar. É nesse lugar que por mais de um século e meio foi explorado o carvão mineral. Também foi a primeira cidade do país a ter energia hidroelétrica própria, telefone e água potável.

Num dos túneis da antiga mina

Segundo o livro “Decifrando a Terra” o carvão é uma rocha sedimentar combustível, formada a partir do soterramento e compactação de uma massa vegetal em ambiente anaeróbico (sem oxigênio), em bacias originalmente pouco profundas, a medida que a matéria orgânica é soterrada, inicia-se o processo de sua transformação em carvão, devido principalmente ao aumento de temperatura e pressão. Os elementos voláteis e a água presentes na matéria orgânica, são expelidos gerando concomitantemente, uma concentração relativa de carbono cada vez maior. A principal matéria-prima do carvão é a celulose

Amostra de carvão
As principais reservas de carvão do Mundo estão na Rússia e EUA. Brasil, por exemplo, tem menos de 0,1% na Bacia do Paraná.

Gráfico de reserva de carvão no Mundo

A região em que visitamos é uma das principais reservas de carvão do Chile, junto a região de Valdívia e Magalhães. Sua exploração ocorreu desde o começo do séc XIX até o ano de 1997, quando o governo diz que os custos de produção saiam mais caros do que importação, essa explicação é controvérsia segundo os habitantes da cidade, que afirmam que tinham outras questões políticas por trás.

Reservas de carvão da região VIII no Chile

Segundo a publicação “Estudio sobre la cuestion carbonera en Chile” o carvão de Chile pertence ao Terciário, formado discordantemente sobre rochas do Cretáceo Superior a leste da Cordilheira Nahuelhuta. Uma particularidade importante na bacia de Lota é a camada de xisto com 30 metros de espessura entre o fundo do mar e a camada de arenito acima do carvão, o que reduz a infiltração de água do mar nas minas.

Perfil do depósito de carvão da mina Lota

Entre as inúmeras minas que existiram, uma em especial criou fama, devido ao escritor Baldomero Lillo, habitante local que em seus contos mostrou a realidade da mina e dos trabalhadores. Essa mina se destacava pelas péssimas condições de trabalho e pela falta de tecnologia em relação a outras, por isso deram encerrado seu funcionamento em 1976, antes das outras. Era um verdadeiro garimpo. Conhecida como “Chiflón del Diablo” seu nome verdadeiro era Chiflón Carlos, hoje em dia transformada e adaptada para visitação turística pela empresa Lota Sorprendente.

Entrada na mina subterranea

O trabalho era todo manual, diferentemente das minas vizinhas que tinham equipamentos para escavar o carvão. O horário de começo de trabalho, para os patrões, era quando escutavam a primeira martelada no carvão, dai em diante os trabalhadores tinham mais 12 horas de labuta, porém o pequeno detalhe é que da casa até o salão na mina em que trabalhavam podiam levar até uma hora para chegar, o que agregaria mais 2 horas na jornada de trabalho desse mineiros. Trabalhavam ajoelhados, com um chapéu de palha como capacete, usando apenas um pedaço de pano para secar o suor e proteger seus narizes quando necessário (“fallaman”), sem luvas, sem óculos de proteção, sem direitos. Suas vidas úteis eram de 30 anos, isso se a artrite, silicose e/ou desnutrição os deixassem. Os pagamentos eram em fichas e só podiam gastá-las no mercadinho da vila, que coincidentemente era dos donos da mina (muito parecido com a exploração da borracha na Amazônia), esse pagamento não era suficiente para quase nada, assim que por falta de dinheiro obrigavam os filhos a trabalhar desde cedo.

Foto das condições de trabalho dos mineiros

Aos 6 anos, um menino já podia começar a trabalhar na mina, suas tarefas variavam desde abrir comportas para que passassem os cavalos que carregavam o carvão, limpar o latão que servia de banheiro ou avisar quando o papagaio da gaiola se virava de costas, isso significava que havia escape de gás natural, conhecido como “grisu”, que gerou muitas explosões e mortes. Como o escritor Baldomero cita em seu livro Subterra: “como filho de mineiros, seu ofício será o mesmo dos seus antecessores, que não tiveram nunca outra escola a não ser a mina” e “os pequeninhos respirando o ar empoeirado da mina cresciam raquíticos, fracos, pálidos, porém havia que resignar-se, pois para isso nasciam”.

Aqui ficavam meninos amarrados para não fugir, abrindo e fechando a comporta e avisando sobre o papagaio da gaiola

As mulheres não escapavam do trabalho, ficavam do lado de fora da mina, esperando o carvão chegar para poder começar a limpá-lo. Nasciam para isso e para “fazer” filhos, futuros mineiros.

Transporte de carvão

Os donos dessa mina era a família Cousiño, que vivia em um verdadeiro palácio na cidade de Lota. Eram tão poderosos e ricos, que na Guerra do Pacífico (1879-1883) emprestaram barcos para o governo. O carvão nesse momento era indispensável, utilizado nos barcos de guerra, fundições, indústria têxtil, ferrovias, transporte, etc. Eles trouxeram a primeira central termoelétrica à região em 1897. Para eles só importava o carvão, assim como diz no livro de Baldomero em relação aos mineiros para os patrões: “cujas vidas tem menos valor para seus exploradores que um pedaço de carvão”.

Antiga entrada do Palácio da família Cousiño, hoje em dia transformado em Parque


Nossa visita durou 2 horas, fomos acompanhados pelos guias Pedro e Piero, que no passado trabalhavam em outras minas de carvão da região. Eles nos mostraram como era o povoado, nos contaram as histórias do lugar, nos levaram a conhecer a mina, para qual deve descer 25 m em um “elevador” bem artesanal, nos mostraram o carvão, nos ensinaram sobre tudo o que está escrito nesse texto. Pessoas que ficaram desempregadas com o fechamento das minas e tiveram que encontrar uma alternativa para trabalhar.

Elevador para descer a mina

Graças a geologia, ao estudo das rochas, podemos descobrir as riquezas do solo e subsolo de uma área, que junto a outros fatores determinam a potência de um país, porém não devemos esquecer que a exploração dessa riqueza pode vir acompanhada de muitas consequências, como a exploração dos trabalhadores, a violação de Direitos Humanos e algumas vezes Direitos das Crianças, o impacto ambiental, o impacto social, a dependência econômica que gera nos povoados, o enriquecimento de alguns poucos a custa do esforço de muitos, entre outros. Lota e região ao redor chegaram a ser um dos setores mais importantes para o país, porém com o encerramento das atividades das minas deixaram milhares de trabalhadores desempregados e sem rumo, eram pessoas que nasciam e viviam para trabalhar com o carvão. Hoje em dia é uma região muito humilde, onde sua riqueza foi abandonada e esquecida.

Carta das crianças da cidade para o escritor Baldomero

Encerro agradecendo a empresa “Lota Sorpendente” por nos receberem e permitirem a visita nesse lugar e ao nosso amigo Brian que nos trouxe até aqui.


Para saber mais sobre o tema recomendo:

- livro e filme “Subterra”, ambos disponíveis na internet.


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